quinta-feira, 18 de junho de 2015

Prémio Camões para Hélia Correia


Hélia Correia sucede ao poeta, historiador e memorialista brasileiro Alberto Costa e Silva, que ganhou o prémio em 2014, e a sua escolha volta a deixar Portugal e o Brasil empatados, com 11 escritores de cada um dos países na lista de premiados.
Não foi a primeira vez que o nome de Hélia Correia surgiu candidato ao Prémio Camões, em 2010, ano do brasileiro Ferreira Gullar ela esteve na disputa até ao fimO júri que escolheu Hélia Correia integrou dois portugueses (o poeta e crítico literário Pedro Mexia e a ensaísta Rita Marnoto, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), dois brasileiros (o poeta e ensaísta Antonio Carlos Secchin e o escritor Affonso Romano Sant'Anna) e dois representantes dos países africanos de língua portuguesa: a ensaísta santomense Inocência Mata, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e o escritor moçambicano Mia Couto, vencedor do prémio Camões em 2013.



O poeta e crítico literário Pedro Mexia, que pela primeira vez fez parte do júri, ao telefone do Rio de Janeiro disse ao PÚBLICO que a decisão “foi extremamente fácil”. Embora Hélia Correia “não seja um nome tão óbvio no Brasil como é em Portugal”, depois de ter sido lançado à discussão, “e tendo em conta que para os jurados brasileiros o nome já estava em cima da mesa de uma votação anterior, foi relativamente pacífico”. Mesmo quem não a tinha na sua lista, “não pôs nenhuma objecção”. A decisão só não foi mais rápida porque houve alguns problemas logísticos – o escritor Mia Couto participou na reunião via Skype e aconteceram alguns problemas de ligação. 
Uma das razões que pesou na escolha do júri foi a sua polivalência em termos de géneros e de estilos. Hélia Correia escreve romance, novela, conto, teatro e poesia e os seus livros são muito diferentes uns dos outros. “Há escritores que escrevem sempre o mesmo livro. Hélia Correia, tendo o seu imaginário, tem livros bastante diferentes entre si”, explica Pedro Mexia. Importante foi também “o diálogo que a autora estabelece com as tradições: com a Antiguidade Clássica, sobretudo grega” e com “um imaginário que não é bem mágico, é telúrico, também de fadas e assombrações”, explica o crítico. “Há um lado também gótico na literatura dela e referências à literatura contemporânea, que vão desde uma personagem de José Saramago até aos livros da literatura inglesa, os vitorianos, as irmãs Brontë e aos pré-rafaelitas.”
in Público

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Dia Mundial da Criança



















A Criança que pensa em fadas e acredita nas fadas 
Age como um deus doente, mas como um deus. 
Porque embora afirme que existe o que não existe 
Sabe como é que as cousas existem, que é existindo, 
Sabe que existir existe e não se explica, 
Sabe que não há razão nenhuma para nada existir, 
Sabe que ser é estar em algum ponto 
Só não sabe que o pensamento não é um ponto qualquer.


Alberto Caeiro, in Poemas Inconjuntos
Enviado por Auxília Ramos

domingo, 26 de abril de 2015

"Enquanto quis Fortuna que tivesse"

Tendo por base o soneto ""Enquanto quis Fortuna que tivesse", os alunos de 10.ºano criaram páginas de um possível diário de Camões. Eis algum dos resultados:


Enquanto quis Fortuna que tivesse
Esperança de algum contentamento,
O gosto de um suave pensamento
Me fez que seus efeitos escrevesse.

Porém, temendo Amor que aviso desse
Minha escritura a algum juízo isento,
Escureceu-me o engenho co tormento,
Para que seus enganos não dissesse.

Ó vós que Amor obriga a ser sujeitos
A diversas vontades! Quando lerdes
Num breve livro casos tão diversos,

Verdades puras são, e não defeitos...
E sabei que, segundo o amor tiverdes,
Tereis o entendimento de meus versos!



1.

Lisboa, 15 de abril de 1575

Mais um dia que termina e continuo sem entender a má Fortuna que me assombra diariamente. Terei sido destinado a tal tormento desde o dia em que nasci? Será que algum dia o irei ultrapassar?
Por muito que tente esquecer toda esta mágoa, dor e sofrimento, é-me impossível. O Amor é força inelutável, implacável, uma entidade superior que todos subjuga, a qual não conseguimos evitar… Oh, quem me dera viver em marés de contentamento, de poder experienciar como todos os outros a felicidade…! Vivo há tanto tempo em tamanha situação de penúria, de guerra, de tristeza que a única forma que encontro para a ultrapassar é através da escrita.
A escrita liberta-me, salva-me de toda a opressão a que sou sujeito. É a ela que devo o facto de ainda não ter perdido a Esperança, de continuar a viver neste mundo desconcertado… Ai, que desespero que sinto! Apesar de ter vivido tão pouco, experienciei tanto… E tudo se presentifica na minha poesia: um breve livro onde partilho as minhas experiências, para que todos possam compreender que não estão sozinhos a enfrentar o Amor, para que todos possam compreender que, tal como eles, eu sofri e sofro por causa dele…
O que me preocupa é que todos pensam que o que exprimo em cada poema é fantasia, tolices da minha mente… mas não são! Tudo o que escrevo é autêntico: são as minhas vivências, a minha história enquanto ser amaldiçoado pela má sorte. E todos aqueles que, tal como eu, vivem neste tormento, rever-se-ão na minha escrita e entenderão os meus versos e a razão pela qual os escrevo.
Surge-me então a questão: devo continuar a viver esta angústia ou encerrar este meu livro de confissões e de desabafos para sempre?
Luís de Camões
Sofia Freitas


2.

Goa, 9 de junho de 1560
Querido livro de desgostos,

Hoje, mais um dia passou, comigo embrenhado numa tristeza silenciosa. A fortuna, essa inglória habitante da minha existência, teima em não servir de leme aos meus voos corajosos.
Os versos já não me servem de refúgio como dantes. A fraqueza transitou-me do corpo débil para a alma que ainda resistia aos infortúnios que a tentavam caçar. O Amor, essa loucura, derrotou-me. Forcei-me a explicá-lo, não fui capaz de o cantar…não consegui fazer dele a força que me impele a tentar vencê-lo. Manipula-me, joga comigo como se fosse um boneco de trapos. Deixa-me sempre maltratado e eu busco-o, de novo, procurando a sensação que, mais tarde ou mais cedo, me será roubada. Meu breve livro de confissões, hoje, sou forçado a fingir, a mentir ao papel e a fazer dele um instrumento ao serviço da minha frustração, do meu fracasso.
Hoje, menti com a minha pena, que tantas vezes me ajudou. Fui mais rato que homem e não suportei os ardis do ultrajante fado. A pior dor com que vivo já não é a do desgosto que sinto, mas sim a dor do desgosto que já nem sou capaz de sentir.
Francisco Caetano

3.

Atraiçoou-me a mente e o corpo o destino que parecia dar alma à minha felicidade. Felicidade autêntica? Essa que cantei quando tinha ainda esperança de algum amor - foi, mas já não o é.
            Temeu que divulgasse todos os seus enganos, o Amor, e, por isso, desertou-me o campo de inspiração e cegou-me para que não encontrasse forma de o expor àqueles que lhe são ainda imunes.
            Será que me ouvem? Urge que me ouçam... Urge que leiam meus versos! Canto-lhes meus dias e minhas vivências, minha dor e meu sofrimento, que tanto mais compreenderão quanto mais envenenados estiverem de Amor.
            São verdades puras, meus versos, e não fantasias... Ouvir-me-ão?
Vera Mariz


4.

Goa, 7 de junho de 1572
Caro confidente,

                A maior parte da minha obra gira em torno do amor, esse sentimento ardiloso. Enquanto quis o destino ludibriar-me com a esperança de ter alguma alegria devida ao amor e me deixou ter e gostar de ter pensamentos amorosos que não me provocassem mágoas, tudo fez com que eu escrevesse acerca dos efeitos do amor (e eu bem sei quais eles são… encarregaram-se de me mostrar essa parte do mundo antes de deixarem de o agraciar com a sua formosura).
                No entanto, após os seus passos deixarem de ser ouvidos na terra, esse Amor, temendo que eu, através da minha genialidade poética, avisasse alguém que nunca tenha experimentado o seu doce toque cortante, decidiu toldar-me a inspiração, inundando-me a mente de sofrimento e miséria, para que não perpetuasse os seus enganos e as ilusões por si provocadas no tempo.
                Ainda assim, para não variar, não é apenas isso que me fere a alma. São os apaixonados que, cegos pelos ledos enganos do terrível Amor, leem o conjunto dos meus poemas líricos, com casos tão diversos de ilusões amorosas, e os julgam uma mera fantasia! O que me perturba é saber que há muitos ignóbeis por aí, que não me entendem e me ridicularizam quando eu sei que não sou o único que foi cegado pelo doce canto das sereias, antes de ver extirpada toda a carne de meus ossos por causa do Amor… E, ainda assim, sou eu o ridicularizado por tentar exprimir a verdadeira face do amor, negra, repleta de diáclases, que tenta preencher com os pedaços que arranca da nossa alma, do nosso coração.
                Mas porquê queixar-me… Já sei que sou e serei sempre eu contra o mundo, desgraçado pela Fortuna e principalmente pelo Amor. Só me resta, pois, lamuriar perante ti, oh meu breve livro de enganos.

Francisca Martins


terça-feira, 24 de março de 2015

Orpheu não morreu!

 Orpheu: “O primeiro grito moderno que se deu em Portugal”
Comemora-se hoje o centenário de Orpheu, cujo primeiro número terá saído da gráfica no dia 24 de Março de 1915. Como um grupo de rapazes de vinte e poucos anos, liderado por Pessoa e Sá-Carneiro, lançou o modernismo em Portugal e mudou para sempre a paisagem cultural e literária do país.
 
“Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!// Hup lá, hup lá, hup-la-hô, hup-lá!/ Hé-há! Hé-hô! Ho-o-o-o-o!/ Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z!// Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!”. Estes versos finais dum poema intitulado Ode Triunfal, assinado por um tal Álvaro de Campos, fechavam o primeiro número da revista Orpheu, que há exactamente cem anos, no dia 24 de Março de 1915, saía dos prelos para escandalizar os meios culturais portugueses.
Todos sabemos hoje que Orpheu foi o primeiro grande momento de afirmação das vanguardas modernistas em Portugal e não é exagero afirmar que as réplicas desse já longínquo terramoto de 1915 se fazem sentir até aos nossos dias. Mas quando a revista saiu, se não passou de todo despercebida, também não se pode dizer que tenha sido propriamente saudada como o decisivo marco literário e cultural que efectivamente foi. “Literatura de manicómio”, chamou-lhe A Capital no título de um dos muitos artigos de crítica mais ou menos galhofeira que assinalaram na imprensa o nascimento de Orpheu.
Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro, sem os quais Orpheu não teria passado de uma curiosidade cujo centenário ninguém se lembraria hoje de comemorar, teriam de esperar uma dúzia de anos até que a geração de autores reunida em torno da revista presença reconhecesse o seu génio e procurasse divulgar o contributo decisivo dessa primeira geração modernista.
Tendo sido a mais icónica revista literária portuguesa de todo o século XX, e seguramente a que exerceu uma influência mais duradoura, Orpheu foi também uma publicação efémera, com apenas dois números publicados no primeiro semestre de 1915. O terceiro, já em provas tipográficas, não saiu por falta de financiamento – tornou-se inviável continuar a recorrer ao mecenato bastante involuntário do pai de Mário de Sá-Carneiro –, e só veio a ser publicado em meados dos anos 80, num fac-símile da prova tipográfica, com a chancela da Nova Renascença, e numa edição organizada por Arnaldo Saraiva para a Ática.
Segundo informa José Barreto num artigo publicado no recém-lançado volume colectivo 1915 – O Ano de Orpheu, organizado por Steffen Dix e editado pela Tinta da China, a primeira das várias notícias que assinalaram o lançamento do número inaugural de Orpheu terá saído no dia 27 de Março, no jornal O Mundo. Até ao final da tarde do dia anterior, diz ainda Barreto, tinham-se vendido apenas 17 exemplares. Apesar deste arranque pouco auspicioso, duas ou três semanas depois a edição estava praticamente esgotada. Tudo indica, pois, que a insistência dos jornais em sugerir que os autores de Orpheu não destoariam entre os loucos internados no manicómio de Rilhafoles terá dado uma ajuda preciosa às vendas, confirmando a cínica máxima de que publicidade negativa é uma contradição nos termos.
Doidos com pedigree

O escândalo provocado por Orpheu não surpreende. Basta dar uma vista de olhos pela poesia que se publicava ao tempo em Portugal para se perceber que, pese embora a qualidade de poetas como Teixeira de Pascoaes ou Afonso Duarte, para citar apenas dois, os meios literários da época, submersos no saudosismo ou no lusitanismo, não estavam preparados para algo tão cataclísmico como a Ode Triunfal.
Nem sequer os poucos livros já então publicados por alguns dos colaboradores de Orpheu, como Distância (1914), de Alfredo Guisado, Luz Gloriosa (1913), do co-director brasileiro do primeiro número, Ronald de Carvalho, ou, no limite, mesmo Dispersão (1914), de Mário de Sá-Carneiro, prenunciavam o frenesi vanguardista de Álvaro de Campos: “(…) Ó tramways, funiculares, metropolitanos,/ Roçai-vos por mim até ao espasmo!/ Hilla! hilla! hilla-hô!/ Dai-me gargalhadas em plena cara,/ Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas (…)”.
No já referido artigo d’A Capital, lia-se: “O que se conclui da leitura dos chamados poemas subscritos por Mário de Sá-Carneiro, Ronald de Carvalho, Álvaro de Campos e outros é que eles pertencem a uma categoria de indivíduos que a ciência definiu e classificou dentro dos manicómios, mas que podem sem maior perigo andar fora deles”. Talvez o jornalista estivesse a ser um pouco injusto ao irmanar os três autores no mesmo insulto, já que em matéria de sinais exteriores de vanguardismo (mas em Pessoa e Sá-Carneiro o próprio vanguardismo foi sempre sinal exterior de rupturas de outra ordem, mais fundas e irremediáveis), nada neste primeiro número de Orpheu é rigorosamente comparável à Ode Triunfal. Nem mesmo alguns versos mais alucinados de Sá-Carneiro, como os que fecham o notável poema 16: “As mesas do Café endoideceram feitas ar.../ Caiu-me agora um braço... Olha, lá vai ele a valsar/ Vestido de casaca, nos salões do Vice-Rei...// (Subo por mim acima como por uma escada de corda,/ E a minha Ânsia é um trapézio escangalhado...)”.

LUÍS MIGUEL QUEIRÓS , 24 de março 2015, in O Público

Morreu Herberto Helder

O maior poeta português da segunda metade do século XX morreu aos 84 anos.

"Quando morre um poeta com a dimensão de Herberto Hélder o que sentimos é que não apenas morreu um poeta mas a poesia", declarou ao PÚBLICO o também poeta madeirense José Tolentino Mendonça, falando de um luto difícil. "Nestes casos o luto torna-se insuportável e, ao mesmo tempo, este luto faz-nos perceber que Herberto Helder é imortal com a sua obra. Daqui a mil anos, se subsistir um falante de língua portuguesa a poesia de Herberto Helder subsistirá".
Entre os muitos poemas do poeta que começou a ler na adolescência, Tolentino Mendonça lembra aquele que começa com o verso "Não sei como dizer-te que a minha voz te procura". É o início de um poema do livro A Colher na Boca, de 1961.
José Tolentino Mendonça lembra que começou muito novo a ler Herberto, e que nessa leitura esteve presente um facto biográfico, "o de também ele ter emergido no contexto insular, na Ilha da Madeira". Isso, continua, "era um vínculo forte para um adolescente que começava também na poesia a procurar razões para a própria vida. E essa descoberta foi a primeira viagem."
Sublinha a insularidade como um traço permanente na poesia de Herberto. Uma insularidade que no seu sentido "está talvez mergulhada a muitas léguas de profundidade do que é essa palavra. Não é uma dimensão muito explícita, mas ler Herberto Helder na Ilha da Madeira tem uma ressonância e uma vitalidade que não se esquece", refere sublinhando um aspecto que considera marcante. "Quando se ouvia Herberto Helder falar, mesmo muitos anos depois de ter saído da ilha, continuava com a pronúncia de um habitante do Funchal. Era um funchalense claramente identificável. E isso era uma nota afectiva de grande impacto."

in Público

sábado, 21 de março de 2015

Dia Mundial da Poesia
















És tu a primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante.

Sophia 

domingo, 8 de março de 2015

Dia da mulher

Uma sugestão especial no Dia Internacional da Mulher:

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Fernando Echevarría vence Correntes d’Escritas


O júri, composto por Afonso Cruz, Almeida Faria (homenageado nesta edição do festival), Ana Paula Tavares, Maria Flor Pedroso e Valter Hugo Mãe justificou a escolha com “o carácter monumental, impressionante pelo seu fôlego e constante equilíbrio de espessura poética”, da obra de Echevarría. Com as suas mais de 500 páginas, e a habitual densidade filosófica e dimensão orgânica dos livros de Echevarría, Categorias e Outras Paisagens (ed. Afrontamento) é, de facto, um exemplo de pujança criativa num autor que recebe este prémio no próprio dia do seu 86.º aniversário.

Na acta do júri, lê-se ainda que o livro de Echevarría “constrói uma poética da lucidez e do rigor num trabalho de grande apuro reflexivo” e constitui “um monumento à capacidade de dizer o indizível no limite das palavras”.
Os restantes finalistas do prémio eram Fernando Guimarães, A. M. Pires Cabral, Nuno Júdice, José Tolentino Mendonça, Luís Quintais, Daniel Jonas, Golgona Anghel, Renato Filipe Cardoso, João Rios, Matilde Campilho e Fabiano Calixto.
A acta do prémio foi lida pela jornalista Maria Flor Pedroso, que assinalou a curiosidade de este prémio coincidir com o dia de anos do poeta, saudado por uma longa salva de palmas. Num discurso invulgarmente conciso para os hábitos da casa, Fernando Echevarría confirmou que reserva o seu fôlego para os poemas. “A única coisa que eu queria fazer aqui”, disse, “é agradecer ao meu editor, porque foi ele que concorreu”. Mas aproveitou ainda para “relevar uma injustiça que há sempre nestas coisas: o prémio é dado ao livro e quem embolsa o prémio é fulano”. E terminou logo a seguir: “O que é que hei-de fazer? Agradecer ao júri que ... pensou em mim, pronto”.

A sessão, no Casino da Póvoa, incluiu ainda uma homenagem ao romancista Almeida Faria, no ano em que se cumprem 50 anos sobre a publicação dePaixão, em 1965, quando já antes publicara, em 1962, aos 19 anos, o inovador Rumor Branco, que ganhou o Prémio de Revelação da Sociedade Portuguesa de Escritores. Também Almeida Faria trouxe um discurso breve, contando como o sucesso do seu livro de estreia desconcertou a família e os amigos no Alentejo do início dos anos 60. O pai achava que, já que escrevia, ao menos se “deixasse de modernices e publicasse um romance a sério”. E um amigo forcado amador ficou bastante desiludido, contou o autor, quando percebeu que o livro não tratava de cavalos e touros.
Almeida Faria contou ainda um episódio pitoresco que resultou da “relativa notoriedade” que o prémio a Rumor Branco lhe trouxera. Foi por essa altura a um leilão de livros em Lisboa e um jornalista do República decidiu noticiar que o jovem autor comprara determinados livros, cujos títulos adiantava. Como em casa de Almeida Faria se comprava o República, a sua mãe leu “a bem intencionada notícia à Virgínia, uma criada analfabeta, filha de pais incógnitos, e que foi criada em nossa casa”. No final, Virgínia voltou-se para Almeida Faria e sugeriu-lhe: “Agora o menino já pode copiar desses livros e escrever outro melhor”. Uma frase que o autor considerou “das mais sábias” que já ouviu, lembrando que já Jorge Luis Borges dizia orgulhar-se dos livros que lera, e não dos que escrevera.
“A literatura, como todas as artes, é esse diálogo com os mestres do passado, através do qual tentamos melhorar o que fazemos”, disse o homenageado, para quem “ler e recombinar textos antigos é talvez a tarefa principal do romancista”. E concluiu com o voto de que a parca Átropos, “encarregada de cortar o frágil fio da vida”, lhe conceda o tempo necessário para que “consiga ainda escrever um livro melhor do que os anteriores e dar razão à Virgínia”.

 LUÍS MIGUEL QUEIRÓs 26/02/2015, in Público

domingo, 11 de janeiro de 2015

Ana Luísa Amaral no Colégio




A escritora Ana Luísa Amaral visitou-nos, a convite dos professores Hélder Moreira e Alexandra Martins. Falou de poesia, de clássicos da literatura, da sua forte ligação com a palavra...

Deixamos o poema que leu, como só ela o sabe fazer, e duas fotos que testemunham a sua presença.


Passado

Ah velha sebenta
em que escrevia as minhas composições de Francês
“Mes Vacances”: gostei muito das férias
je suis allée à la plage (com dois ee,
o verbo ètre pede concordância), j’ai beaucoup
nagé e depois terminava com o sol a pôr-se
no mar e ia ver gaivotas ao dicionário

As correcções a vermelho e o Passé Simple,
escrever cem vezes nous fûmes vous fûtes ils fúrent
as tardes de sol
e Madame Denise que dizia Toi ma petite
com ar de sargento e a cara zangada a fazer-se
vermelha (tenho glóbulos a mais, faites attention)
e o olhar que desmentia tudo
em ternura remplit

E as regras decoradas e as terminações
verbais a i s, a i s, a i t,
a hora de estudo extra e o sol de fim de tarde
a filtrar-se pelas carteiras,
a freira a vigiar distraída em salmos
eu a sonhar de livro aberto
once upon a time there was a little boy
e as equações de terceiro grau a uma
incógnita

Ah tardes claras em que era bom
ser boa, não era o santinho nem o rebuçado
era a palavra doce a afagar-me por dentro,
as batas todas brancas salpicadas de gouache
colorido e o cinto azul que eu trazia sempre largo
assim a cair de lado à espadachim

As escadas de madeira rangentes
ao compasso dos passos, sentidas ainda
à distância de vinte anos,
todas nós em submissa fila a responder à chamada,
“Presente” parecia-me então lógico e certo
como assistir à oração na capela e ler as Epístolas
(De São Paulo aos Coríntios:
Naquele tempo...),
tem uma voz bonita e lê tão bem, e depois
mandavam-me apertar o cinto para ficar
mais composta em cima do banquinho,
à direita do padre

E o fascínio das confissões,
as vozes sussurradas na fina teia de madeira
castanha a esconder uma falta,
o cheiro do chão encerado e da cera das velas
e quando deixei de acreditar em pecados
e comecei a achar que as palavras não prestam
e que era inútil
inútil a teia de madeira

Ah noites de insónia à distância de vinte anos,
once upon a time there was a little boy
and he went up on a journey
there was a little girl, une petite fille
e o passé simple, como parecia simples o passado

Au clair de la lune
mon ami Pierrot
Prête-moi ta plume
pour écrire un mot

Escrever uma palavra
uma só
ao luar
a pedir concordância como uma carícia
Elles sont parties,
les mouettes

sábado, 20 de dezembro de 2014

Em jeito de oratória

Os alunos do 11.º ano desenvolveram, no final do estudo do "Sermão de Santo António aos Peixes", de Padre António Vieira, uma proposta de reescrita do primeiro parágrafo do texto, sublinhando a sua dimensão alegórica. Eis três resultados:


*
Vós, diz professor, mestre nosso, falando com os alunos, sois os livros do pensamento, e chama-lhes os livros da razão, porque quer que façam na razão o que fazem os livros. O efeito dos livros é impedir a ignorância; mas quando na razão se vê tão ignorante como está a nossa, havendo tantos com o ofício de livro, qual será, ou qual pode ser a causa desta tamanha ignorância? Ou é porque os livros não informam, ou porque na razão se não deixa informar. Ou é porque os livros não informam, e os alunos não alimentam a razão com a verdadeira sabedoria; ou porque o pensamento se não deixa informar, e a razão prefere a ignorância que a outra cousa que lhe deem. Ou é porque os livros não informam, e os alunos aprendem uma coisa e fazem outra; ou porque a razão não se deixa informar, e prefere seguir o livro à letra ignorando o seu verdadeiro conteúdo. Ou é porque os livros não informam, e os alunos alimentam-se a si e não à razão; ou porque o pensamento não se deixa informar, e a razão prefere interiorizar o que lhe convém em vez de aquilo que deve ser interiorizado. Não é isto tudo verdade? Não sabeis? Então lede, lede! Ainda mal!
Afonso Azevedo, 11.º A



*
Vós, diz Cristo, senhor nosso, falando com os alunos, sois a luz da terra: e chama-lhes luz da terra, porque quer que façam na terra o que faz a luz. O efeito da luz é iluminar; mas quando a terra se vê tão escura como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de luz, qual será, ou qual pode ser a causa desta escuridão? Ou é porque a luz não ilumina, ou porque a terra se não deixa iluminar. Ou é porque a luz não ilumina, e os alunos não se esforçam por aprender; ou porque a terra se não deixa iluminar, e os homens não garantem condições de aprendizagem aos alunos. Ou é porque a luz não ilumina, e os alunos julgam que sabem tudo; ou porque a terra se não deixa iluminar, e os homens julgam que os alunos não sabem nada. Ou é porque a luz não ilumina, e os alunos não põem em prática aquilo que aprendem; ou porque a terra se não deixa iluminar, e os homens não dão valor aos alunos. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!
Sara Cunha, 11º A



*
Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os alunos, sois o nascer do Sol de um novo dia: e chama-lhes nascer do Sol, porque quer que façam no dia o que faz o Sol. O efeito do Sol é dar início à esperança e à alegria, mas quando o dia se vê tão escuro e triste como os nossos, havendo tantos nasceres do Sol, qual será, ou qual pode ser a causa desta tristeza? Ou é porque o Sol verdadeiramente não nasce ou porque o dia não deixa o Sol nascer. Ou é porque o Sol não nasce, e os alunos não se esforçam, ou porque o dia não deixa o Sol nascer, e a sociedade, não ouvindo os alunos, menospreza o seu contributo futuro. Ou é porque o Sol não nasce, e os alunos imitam a sociedade atual, ou porque o dia não deixa o Sol nascer, e a sociedade se conforma sem qualquer mudança. Ou é porque o Sol não nasce, e os alunos ambicionam o bem e não o concretizam, ou porque o dia não deixa o Sol nascer, e a sociedade não instrui devidamente os alunos, manipulando-os por interesses próprios. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!
Manuel Rocha, 11.º A


domingo, 30 de novembro de 2014

Fernando Pessoa

Em dia de aniversário da morte de Fernando Pessoa, uma edição em Braille da obra Mensagem:





terça-feira, 25 de novembro de 2014

Feira do Livro 2014

Deixamos o cartaz e os autores que visitarão o colégio durante esta semana!





domingo, 16 de novembro de 2014

Pessoa por Paulo Galindro


Para conhecer o trabalho de Paulo Galindro, clicar aqui.

domingo, 12 de outubro de 2014

Nobel da Literatura 2014


O laureado, de 69 anos, nascido em Boulogne-Billancourt, nos arredores de Paris, a 30 de julho de 1945, herdou dos pais essa memória da guerra: o pai, um judeu natural de Alexandria, conheceu a mãe, atriz belga, durante a ocupação francesa, pelas forças nazis.



Devido às digressões profissionais da mãe, estudou em várias escolas, um pouco por toda a França, e completou os estudos do liceu em Paris, uma cidade que se viria a tornar cenário frequente nas suas obras.

Aos 12 anos sofreu o desgosto da morte do irmão mais novo, com quem tinha uma relação muito próxima, e a quem viria a dedicar o primeiro livro, La Place de l'Étoile (1968).

Só um ano antes da publicação deste primeiro livro Modiano conseguiu uma situação financeira estável para passar a dedicar-se totalmente à escrita, depois de ter tido vários empregos para sobreviver.

Os temas da memória, do esquecimento, da identidade e da culpa vão marcar a futura obra do autor, que obteve um sucesso quase imediato com o primeiro romance, intensificado com o segundo, La Ronde de Nuit (1969), e o terceiro, Les Boulevards de Ceinture (1972).

O Grande Prémio de Romance da Academia Francesa, em 1972, e o Prémio Goncourt, em 1978, pela obra A Rua das Lojas Escuras (1978) - publicado em Portugal pela editora Relógio d'Água, em 1987 - vieram trazer-lhe um lugar definitivo na literatura francesa.

Patrick Modiano manteve-se um autor prolífico nas duas décadas seguintes, publicando obras como Quartier Perdu (1984), Catherine Certitude (1988), ilustrado por Sempé, ou Remise de Peine (1988).

Em Portugal seriam ainda publicados os livros Domingos de Agosto (1986), pela Dom Quixote, em 1988, Dora Bruder (1997), pelas Edições ASA, em 1998, No Café da Juventude Perdida (2007), também pelas Edições ASA, em 2009, e Horizonte (2010), pela Porto Editora, em 2011.

Na altura, o editor Manuel Alberto Valente, da Porto Editora, definiu Modiano como "o principal escritor francês da atualidade".

Modiano viria a ser galardoado com o Grande Prémio Nacional das Letras de França, em 1996, num tributo pela totalidade da sua obra, que se manteve assinalada por uma fundação autobiográfica ou acontecimentos decorridos durante a ocupação alemã.

Dora Bruder é um exemplo dessa memória histórica, sobre uma rapariga de 15 anos que vive em Paris e que se torna vítima do Holocausto.

Patrick Modiano também escreveu livros para crianças e argumentos para filmes, nomeadamente, com o realizador Louis Malle, para a longa-metagem Lacombe Lucien (1974), passada na França, durante a ocupação alemã, protagonizada por um jovem.

O livro mais recente do galardoado com o Nobel da Literatura é deste ano, e intitula-se Pour que tu ne te perdes pas dans le quartier.

Patrick Modiano é o 15.ª autor francês distinguido com o Nobel da Literatura. O galardão será entregue numa cerimónia em Estocolmo, a 10 de dezembro.

Do artigo da Visão Ler mais: http://visao.sapo.pt/conheca-patrick-modiano-premio-nobel-da-literatura=f797854#ixzz3Fx9bb0nT 

Um dos livros de Mondiano.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Escritaria 2014

A edição deste ano foi dedicada à escritora Lídia Jorge.


Clicar na imagem, para aceder ao vídeo.

Enviado por Auxília Ramos

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Dia Mundial da Música

Onde as palavras falham
​,​
 a música fala
​.​
 
 Hans Christian Andersen
























Enviado por: Auxília Ramos

domingo, 28 de setembro de 2014

Escritaria | 2014





































E a propósito de Lídia Jorge, deixamos também uma entrevista muito especial, feita pela escritora a Frei Bento Domingues: http://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/estou-no-meio-do-misterio-1670822

Enviado por: Auxília Ramos