terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Texto Descritivo - 7º Ano

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O que se segue é produto de uma oficina de escrita, nas turmas de 7º Ano, dedicada ao texto descritivo. Os alunos tentaram pintar com palavras... Eis alguns dos melhores excertos (a ordem é completamente aleatória):

1.

As árvores debruçavam-se sobre as suas ambíguas sombras, aflorando-as com as carícias das folhas amarelas, vermelhas e doiradas, na hora do crepúsculo triste que ia tentando tocar nas montanhas.Os seus troncos erguiam-se placidamente, eram pássaros pairando nos mais altos céus. Um manto de oiro lânguido atravessava o taciturno caminho e envolvia a vasta imensidão numa luz onírica que dançava por entre as colinas. Uma nuvem fulgia solitariamente no firmamento esmaecido e pálido. Só o vento acariciava as folhas com a sua cálida brisa...
Carlos Braga
2.
Ao fundo, uma névoa ténue passeava, suave e vagarosamente, como uma gaivota de asas abertas para o infinito.
José Fonseca
3.
As cores e as tonalidades lúgubres, esmaecidas e sem força, dançavam em torno das bonecas e obliteravam-se serena e lentamente como um crepúsculo escondido no horizonte.
Rita Freitas
4.
Como salpicos, os arbustos cobriam a montanha, que se erguia imponente sobre o infinito - era uma garça em pleno voo. Coberta de neve, vagueava por vales taciturnos e solitários. Em cima, pairava uma nuvem onírica de tons crepusculares.
Tomás Silvestre
5.
Ao longe, montanhas sumptuosas e imponentes elevavam-se querendo beijar o céu e cobrindo-se de uma leve e brilhante luz. O céu resplandecia num crepúsculo infinito e interminável. As nuvens tocavam os cardumes de montanhas que bailavam sobre a paisagem, reflectindo as suas sombras. A distância trazia um doce e fresco aroma e parecia ouvir-se um longínquo cantar de estrelas...
Catarina Abrunhosa
6.
Do alto do céu, o horizonte infinito mergulhava numa luz magistral e ténue que anunciava os primeiros raios de sol. A manhã avançava, leve e lenta, passeando docemente e penetrando na escuridão indelével da noite, fazendo o dia nescer. As montanhas imponentes pareciam querer tocar o céu azul que mirava extasiadamente o seu reflexo no rio, seguindo em curvas, sinuosa e tranquilamente, pelo bosque. Os campos verdejantes contrastavam com o tom rosicler da aurora. Os insectos brincavam, saltitando sobre os viçosos ramos das árvores.
Já o dia ia a meio, e o tranquilo rio assemelhava-se a um lago adormecido: as águas estavam paradas e envoltas numa névoa espessa...
Então, a noite retornava suave e docemente e, no seu sombrio manto, realçava os cardumes prateados e fulgentes que incandesciam a corrente líquida.
Alfredo Graça
7.
No céu azul imenso, nuvens dançam timidamente umas com as outras, passeando pelas montanhas, ao longo do infinito. Em baixo, a água do lago torna-se espelho, deslizando lentamente. O vento estremece as águas, enquanto estas gritam interminável e tristemente. As árvores baloiçam ao sabor do vento e as sumptuosas montanhas caem velozmente serra abaixo. O barco, sentado, espera descansadamente em terra firme a sua próxima viagem.
Tiago Costa
8.
No cimo do abismo, segurando-se às raízes da terra, um misterioso e imponente castelo cede à lenta respiração do céu o sossego ornamentado da paisagem. As imponentes árvores comandam cardumes de arbustos, organizados como um exército verde que segue fielmente o seu general. Um manto de rochas rugosas dorme como se gotas de chuva o acariciassem suavemente.O céu cobre-se de uma mistura de cores, manchado sobretudo pelo branco das suas fugidias cúmplices, as nuvens.
Raquel Matos
9.
Como um homem descalço, o barco rabelo progredia lentamente, atravessando as calmas águas do rio Douro. Era um final de tarde quente e uma névoa lúgubre passeava revoltamente no céu. O rio reluzia como prata, adormecido no seu leito. Uma casa amarela espalhava luzes, brilhos, música e vozes, enfiteiçando as alegres águas que, cansadas, tentavam chegar à foz...
Tiago Santos
10.
O céu esmaecia lentamente sobre um suave crepúsculo que embalava as árvores, temendo o anoitecer. A cascata desaguava rapidamente, esfumando-se e espraiando-se nas rochas. Calmamente, as águas abrandavam e depois chegavam, taciturnas e lânguidas, ao seu destino. Largos vestígios de passos dos animais eram desvelados pelo luar luminoso que se entranhava nas rugas das árvores.
José Matos
11.
Os telhados estavam revestidos de um tecido muito macio. As pequenas casinhas pareciam tocar a imensidão do céu. O mar era azul, reflectindo o firmamento e as nuvens pareciam passear num vasto jardim. Os barcos eram cardumes de peixes fulgindo nas águas. As rochas ásperas precipitavam-se lentamente no infinito como um caracol a atravessar um manto de ouro.
Rui Pedro

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

As ilustrações que se seguem são da autoria do aluno João Miguel Cunha que, sem palavras, traçou o perfil das personagens estudadas até agora.

Sem palavras...







segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente
O Fidalgo
“O facto é que, embora relativamente raros, os fidalgos aparecem também duramente atacados nos autos. No Auto da Barca do Inferno caracteriza-se por uma presunção balofa e por explorarem o trabalho dos servidores sem lhes pagar.”
LOPES, Óscar e SARAIVA, António José, História da Literatura Portuguesa



O “poderoso dom Anrique” é a primeira personagem a comparecer no cais. Desde o início, revela superioridade e arrogância (“Esta barca onde vai ora, / que assi está apercebida?”). Por isso, é recebido pelo Diabo com cerimónia e ironia (o recurso à forma de tratamento “vós” por parte do Arrais do Inferno comprova-o), o que evidencia um falso tratamento cortês inicial que se irá, depois, desvanecer (“Senhor, a vosso serviço”, "Ó poderoso dom Anrique / cá vindes vós?”).
Porém, quando se apercebe que embarcará na Barca do Inferno, procura uma alternativa, a Barca do Paraíso, dirigindo-se a outro Arrais, o Anjo, confiado no seu título de “fidalgo de solar”. Nada corre, todavia, como ele esperava. Primeiramente, nem sequer é capaz de invocar o Anjo com sucesso; sendo mesmo mencionados os seus sussurros amuados, em aparte, quando não lhe respondem (“Par Deos, aviado estou! / Cant’a isto é já pior… / Que jiricocins, salvanor! / Cuidam que são eu grou?”).
O Anjo, aqui representado como uma criatura justa, altiva e superiormente segura, responder-lhe-á com desdém e reprovação. A censura angelical reprova a tirania cortês, exercida por este fidalgo, e que é cenicamente representada pelo pajem que acompanha dom Anrique (“Não se embarca tirania / neste batel divinal”; “desprezastes os pequenos”). Aliás, a sua cadeira simboliza a convicção na salvação com base numa falsa vivência da religião. Também o rabo surge como elemento cénico que traduz o seu estatuto social e hierárquico.
Face à recusa do Anjo, regressa ao batel infernal, onde é esperado euforicamente pelo Diabo. Nesta terceira parte, o seu comportamento muda radicalmente, apresentando-se agora resignado e conformado (“Ao Inferno todavia”). Além disso, verificamos igualmente um porte triste e o arrependimento doloroso (“folgava em ser adorado; / confiei em meu estado / e não vi que me perdia). Somente após as palavras sarcásticas do Diabo sobre a condição da mulher quinhentista, se consciencializa da inevitabilidade do seu destino.
D. Anrique é uma personagem-tipo, representativa de todos os nobres e cortesãos que mantinham uma conduta religiosa falsa e uma postura ética condenável, evidenciando uma arrogância resultante do estrato social a que pertenciam e que lhes garantiam todos os direitos e prerrogativas.
Em suma, o Fidalgo simboliza toda uma nobreza decadente, em crise profunda de valores (denunciada na cena pela conduta adúltera do próprio Fidalgo e pela sua condenação genética – o pai também já cometera os mesmos pecados). Mais uma vez, Mestre Gil faz valer o seu lema: ridendo castigat mores...

Ana Isabel Costa