quarta-feira, 28 de outubro de 2009

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Pessoa(s) - 12ºAno

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Pedimos aos alunos de 12º que analisassem a génese da heteronímia pessoana. Eis alguns resultados apresentados em turma (um vídeo e um texto):
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Ana Catarina Rodrigues, 12C

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Carta de Fernando Pessoa ao seu
Semi-heterónimo Bernardo Soares

Lisboa, 13 de Junho de 1930

Meu caro Bernardo Soares,

Finalmente chegou a oportunidade de poder falar contigo, agora que cheguei fatigado do escritório. Muito me apraz teres-te lembrado do meu aniversário, pois do teu dificilmente me recordaria, tão ocupado que estou com a minha pessoa, que uma não é (como de certo o sabes), mas quatro em simultâneo.
Não será ousado eu pensar, Bernardo, que hoje me visitaste de madrugada, quando estava abandonado às insónias? É que no silêncio do meu quarto pareceu-me adivinhar a tua figura sentada à minha secretária, iluminada pelo luar. Foi então que exclamei: “Ora viva! É o meu amigo Bernardo!”. Como não obtive resposta, convenci-me de que, para não variar, a minha imaginação me pregara uma partida. Ainda assim, fiquei com a sensação de que havias tentado comunicar comigo, e foi com satisfação que li a tua carta de parabéns. Bem sei, contudo, que o teu objectivo era o de compreenderes o porquê de teres sido excluído do meu círculo de heterónimos, não obstante o prefixo semi- que te concedi por compaixão.
Sendo hoje o meu quadragésimo segundo aniversário, que te parece que enquadre a génese dos meus heterónimos na história da minha vida? Estou certo de que concordas. Pois bem, nunca te apercebeste de algo omnipresente em ti, uma característica que fizesse parte das tuas raízes, e que em última análise condicionasse toda a tua personalidade? Não posso dizer que os meus primeiros anos foram miseráveis: a morte do meu pai abalou-me, como seria expectável, mas em compensação tive o amor da minha família, principalmente da minha mãe. Mesmo assim, o mundo extrínseco, ainda que agradável, sempre me pareceu insuficiente. Havia uma miríade de pessoas que poderia ter conhecido, diálogos que porventura teria trocado... E, olhando para o passado, reparo que a simplicidade da infância, que deveria contentar qualquer criança, constituía para mim um desperdício de sensações. E então, quase inconscientemente, passei a olhar a realidade por um certo prisma, prisma esse que elevava a vida simples de um menino a um mundo onírico, onde qualquer lacuna era preenchida com amigos imaginários.
Se me vires a atravessar o Chiado ou a trabalhar no meu escritório, consegues adivinhar o que se passa dentro da minha mente? Certamente que não. Uma pessoa nunca espera entrever um neurasténico (defino-me como tal, embora não saiba ao certo o que sou) num homem calado e de bons modos. O silêncio não significa necessariamente paz de espírito; pode estar a mascarar, inclusive, algo mais profundo. O que acontece é que, quando a oportunidade vem, o meu olhar volta-se para dentro. Olho para as coisas sem as ver, pois estou ocupado a assistir ao meu monólogo interior. E eis que, sozinho na plateia, vejo claramente três homens distintos a desfilarem pelo palco da minha mente. A ambiguidade desta situação acentua-se quando tomo consciência de que, neste instante, não sou uma, mas duas pessoas: o espectador e o actor. Respeitando as leis da cronologia, surge o Ricardo Reis, médico portuense, de estatura baixa e semblante sério, e que vive no Brasil desde 1919 por ser monárquico. Curiosamente, ele apareceu por acaso. Erro meu! Os meus «eus» nascem em mim com um propósito; eu é que, por vezes, não o desvendo à primeira. Depois de escrever uns poemas de cariz pagão, senti-me estranho. Não tinham muito a ver comigo, e ainda bem, pois assiná-los com o meu nome seria plágio. O Ricardo apareceu para expressar uma visão estoicista da vida, uma reflexão abstracta que conduzia à consciência da nossa efemeridade. Estás confuso com este jogo de máscaras, Bernardo? Uma coisa te digo: primeiro, estranha-se; depois, entranha-se. Agora irei falar do meu Mestre (meu, do Ricardo, e do Álvaro, o qual mencionarei a seguir). Uma conversa com o meu amigo Sá-Carneiro desencadeou uma série de acontecimentos que levaram à criação do pastor Alberto Caeiro. Duvido que exista pessoa mais ignorante que ele, e por isso mais feliz na sua ignorância. A sua atitude faz-me lembrar a de uma criança, pois ama o mundo que observa sem qualquer reserva. Por vezes me espanto, pois parece impossível que seja eu o autor da sua filosofia do não pensar. Não é contraditório? Ele morreu há mais de uma década, mas a sua figura ainda simboliza para mim o que eu nunca conseguirei ser. É por sermos tão opostos que ele é o meu Mestre. Como discípulo, tento seguir-lhe as passadas, ainda que saiba que nunca o vá alcançar. O outro heterónimo é o engenheiro naval Álvaro de Campos, meu gémeo nesta fase final da sua vida. O Álvaro representa, digamos, a faceta da minha personalidade que procuro esconder, o histerismo no seu expoente máximo. Todas as minhas emoções fortes (e algo vergonhosas, diga-se de passagem) são abafadas e, assim, canalizadas para um sítio aonde ninguém tem acesso excepto eu.
Tens de compreender, Bernardo, o que te diferencia destas três personalidades. Quando escrevo de modo espontâneo como Caeiro, intelectual como Reis, ou extravagante como Campos, o meu ser fluí pelas suas identidades livremente. Pintei o quadro das suas vidas, moldei os seus traços psicológicos e físicos, enfim, contornei nitidamente o que inicialmente eram formas indefinidas.
O que são estes três homens senão a expressão de posições opostas sobre a vida, a estética, e a literatura? Já te apercebeste, Bernardo, de que esta diversidade tão grande de mentalidades reflecte a minha multiplicidade interior? A vida, por vezes, é tão vazia de conteúdo e de pessoas que se torna necessário simular outras vidas para experienciar o que me passa ao lado. Ser complexo, Bernardo, permite-me ser todos, e, assim, nenhum. Os heterónimos representam o nada que é tudo. Sem eles, o vulgar e solitário Fernando Pessoa deixa-se subjugar pelo tédio.
É nestes devaneios e angústias existenciais que a fadiga incentiva que eu recorro a ti, Bernardo, um pobre ajudante de guarda-livros. És como uma muleta, um estado de quase inconsciência, um andar ausente pelas ruas de Lisboa. Careces de vida autónoma, meu caro amigo (não quero que te sintas diminuído por isto!).
Concluo a minha carta com um pensamento profundo, bem ao teu gosto. A Arte tem fim na própria Arte. A actividade literária dos meus heterónimos busca a beleza estética que só eles tornam possível.
Espero que te tenha esclarecido quanto à tua condição de semi-heterónimo.
Cumprimentos,
Fernando Pessoa.

PS – Obrigado pelo manuscrito que me emprestaste do teu “Livro do Desassossego”. Apreciei particularmente este fragmento, reflecte precisamente a angústia de me saber sempre só: «(…) De tanto pensar-me, sou já meus pensamentos mas não eu. Sondei-me e deixei cair a sonda; vivo a pensar se sou fundo ou não, sem outra sonda agora senão o olhar que me mostra, claro a negro no espelho do poço alto, meu próprio rosto que me contempla contemplá-lo.».
Filipa Alves Santos, 12B

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Escritaria - um testemunho

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Domingo à noite, o Museu Municipal de Penafiel (que eu não conhecia) encheu-se de centenas de pessoas para ouvir José Saramago e assistir ao lançamento “mundial” do seu último romance Caim. Assinalo com aspas «mundial» da mesma forma que Saramago, a propósito do evento, referiu, ironicamente, que não via, na sala, a presença de jornalistas do New Yorker

Penafiel foi, pois, palco de um acontecimento mundial, no seio de um acontecimento literário – Escritaria, 2º festival literário, um acontecimento que trará, indubitavelmente polémica, porque polémico foi o discurso de Saramago. Lembrei-me, ao ouvi-lo, das palavras de Pilar del Rio – "a grande literatura é sempre provocatória" – pois todas as referências do romancista a Caim revelam-nos uma nova incursão de Saramago no universo da(s) religião(ões), uma incursão claramente provocatória. O romancista referiu-se à Bíblia e, principalmente, ao Antigo Testamento como um “livro de maus costumes”, um livro em que a crueldade, a violência, a disputa são por demais evidentes nas várias narrativas que o integram. Acrescentou que “não inventa nada”, apenas “levanta pedras do caminho para que o leitor possa ver o que está por baixo delas”, lançando um apelo explícito a que cada um de nós possa, livremente, reflectir e analisar todo o mal que a religião (qualquer uma) fez à humanidade. Para Saramago, Caim “é um exercício de liberdade”, liberdade para o personagem e para ele próprio, enquanto escritor – “A liberdade do ser humano assim o exige.”



A encerrar o seu longo discurso, Saramago leu as páginas iniciais do romance como motivação para a leitura que, no seu dizer, irá certamente divertir o leitor, e prometeu um novo livro para 2010.



Quando o senhor, também conhecido como deus, se apercebeu de que a adão e eva, perfeitos em tudo o que apresentavam à vista, não lhes saía uma palavra da boca nem emitiam ao menos um simples som primário que fosse, teve de ficar irritado consigo mesmo, uma vez que não havia mais ninguém no jardim do éden a quem pudesse responsabilizar pela gravíssima falta, quando os outros animais, produtos, todos eles, tal como os dois humanos, do faça-se divino, uns por meio de mugidos e rugidos, outros por roncos, chilreios, assobios e cacarejos, desfrutavam já de voz própria. Num acesso de ira, surpreendente em quem tudo poderia ter solucionado com outro rápido fiat, correu para o casal e, um após outro, sem contemplações, sem meias-medidas, enfiou-lhes a língua pela garganta abaixo. Dos escritos em que, ao longo dos tempos, vieram sendo consignados um pouco ao acaso os acontecimentos destas remotas épocas, quer de possível certificação canónica futura ou fruto de imaginações apócrifas e irremediavelmente heréticas, não se aclara a dúvida sobre que língua terá sido aquela, se o músculo flexível e húmido que se mexe e remexe na cavidade bucal e às vezes fora dela, ou a fala, também chamada idioma, de que o senhor lamentavelmente se havia esquecido e que ignoramos qual fosse, uma vez que dela não ficou o menor vestígio, nem ao menos um coração gravado na casca de uma árvore com uma legenda sentimental, qualquer coisa no género amo-te, eva. Como uma coisa, em princípio, não deveria ir sem a outra, é provável que um outro objectivo do violento empurrão dado pelo senhor às mudas línguas dos seus rebentos fosse pô-las em contacto com os mais profundos interiores do ser corporal, as chamadas incomodidades do ser, para que, no porvir, já com algum conhecimento de causa, pudessem falar da sua escura e labiríntica confusão a cuja janela, a boca, já começavam elas a assomar. Tudo pode ser. Evidentemente, por um escrúpulo de bom artífice que só lhe ficava bem, além de compensar com a devida humildade a anterior negligência, o senhor quis comprovar que o seu erro havia sido corrigido, e assim perguntou a adão, Tu, como te chamas, e o homem respondeu, Sou adão, teu primogénito, senhor. Depois, o criador virou-se para a mulher, E tu, como te chamas tu, Sou eva, senhor, a primeira dama, respondeu ela desnecessariamente, uma vez que não havia outra. Deu-se o senhor por satisfeito, despediu-se com um paternal Até logo, e foi à sua vida. Então, pela primeira vez, adão disse para eva, Vamos para a cama

Indubitavelmente uma leitura polémica, mas certamente uma leitura que possibilitará a liberdade de cada leitor se posicionar criticamente sobre o seu conteúdo, qualquer que seja a sua crença religiosa.
Auxília Ramos
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E uma outra visão, sobre a polémica que estas afirmações causaram. Via José Rui Teixeira e Equinócio de Outono, fica o comentário de Tolentino Mendonça:
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José Tolentino Mendonça, director do Secretariado Nacional da Pastoral Cultura, manifestou à Agência Ecclesia a sua "desilusão" com a obra Caim, novo livro de José Saramago, que considera uma releitura "banal" do texto bíblico, longe das "páginas magistrais" de John Steinbeck em A Leste do Paraíso ou da interpretação do filósofo Paul Ricoeur da fraternidade como "decisão ética".
A obra ficou envolta em polémica quando o autor, a propósito da apresentação mundial do livro, afirmou que "a Bíblia é um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade e do pior da natureza humana".
"A perplexidade trazida pelas afirmações de José Saramago é, no fundo, como é que um grande criador, um grande cultor da língua, pode, em relação a um superclássico da literatura mundial – património de cultura diferentes, fonte de inspiração para tanta literatura – pode dizer da Bíblia, com o simplismo e o olhar com que o fez, as coisas que Saramago tem dito", atira o director do Secretariado Nacional da Pastoral Cultura.
Tolentino Mendonça lamenta que, em Caim, José Saramago escreva que a Bíblia é "o livro dos disparates". "É uma redução inaceitável, não só do ponto de vista da fé, mas do ponto de vista da cultura", defende. Saramago é um leitor que "revisita permanentemente a Bíblia", seja em citações, seja nas suas personagens, mas o resultado desse esforço na sua última obra é, para o sacerdote madeirense, "absolutamente uma desilusão".
"Esperar-se-ia muito mais da revisitação que um grande escritor pode fazer do texto bíblico", indica, considerando que o livro de Saramago é, "em grande medida, um texto banal". A Bíblia está aberta a várias leituras, crentes e não crentes, mas nem todas são válidas.
O exegeta e poeta manifesta "perplexidade" por Saramago não tomar em consideração a necessidade de uma "interpretação" do texto, tomando-o à letra, "no seu absurdo". "O que impressiona neste opção é ele recusar que aquele texto precisa de uma interpretação, de uma leitura simbólica", declara. José Tolentino Mendonça realça que a Bíblia "é um livro de fé, que é lido a partir dessa perspectiva por milhões de pessoas, e ao mesmo tempo um livro de literatura, um superclássico".
Nesse sentido, é necessária "uma compreensão da Bíblia enquanto texto literário para verdadeiramente chegar ao seu sentido", é preciso "ir à terra do poeta", como se referia no Vaticano II, perceber que há "um sentido segundo, terceiro, que não se pode ler de forma literal e unívoca, que os géneros literários são para respeitar".
O sacerdote considera ainda que as declarações de José Saramago sobre Deus e a Bíblia estão muito marcadas pela ideologia do escritor, mais do que por uma tentativa de "recriação profunda das temáticas abordadas nos textos bíblicos".

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Parabéns, Agustina!

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Agustina Bessa-Luís nasceu em Vila Meã, Amarante, em 1922. A família do seu pai era do Norte do país e a sua mãe era espanhola.

Viveu durante a infância e adolescência na região de Entre-Douro e Minho e depois em Coimbra até 1948. Casou em 1945 com Alberto de Oliveira Luís. A partir de 1948 fixou residência no Porto.

Começou a escrever aos 16 anos e em 1950 publicou o seu primeiro romance, “Mundo Fechado”. O reconhecimento chegaria em 1952, com a atribuição do Prémio Delfim de Guimarães ao livro “Sibila”, galardoado no ano seguinte com o Prémio Eça de Queiroz.
Estreou-se no teatro em 1958 com “O Inseparável”.

Foi membro do conselho directivo da Comunitá Europea degli Scrittori (Roma, 1961-1962). Entre 1986 e 1987 foi Directora do diário O Primeiro de Janeiro (Porto). Entre 1990 e 1993 assumiu a direcção do Teatro Nacional de D. Maria II (Lisboa) e foi membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social. É membro da Academie Européenne des Sciences, des Arts et des Lettres (Paris), da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa, tendo já sido distinguida com a Ordem de Sant'Iago da Espada (1980), a Medalha de Honra da Cidade do Porto (1988) e o grau de "Officier de l'Ordre des Arts et des Lettres", atribuído pelo governo francês (1989).

Várias obras suas foram traduzidas em diversos países e algumas foram adaptadas ao cinema por Manoel de Oliveira, como “Francisca”, “Vale Abraão” e “As Terras de Risco”. O seu romance “As Fúrias” foi adaptado ao teatro por Filipe La Féria.

Aos 81 anos, Agustina Bessa-Luís recebeu o Prémio Camões, considerado o mais importante prémio literário da língua portuguesa.

Escritaria e José Saramago em Penafiel

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quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Prémio Nobel da Literatura 2009

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O Prémio Nobel da Literatura foi atribuído este ano à escritora alemã de origem romena Herta Müller, de 56 anos.

A Academia sueca sublinha que Herta Müller consegue, "com a densidade da sua poesia e a franqueza da sua prosa, retratar o universo dos desapossados".

Müller é autora de livros como “O homem é um grande faisão sobre a terra”, editado em Portugal pela Cotovia, e “A terra das ameixas verdes”, publicado a nível nacional pela Difel.

Nascida a 17 de Agosto de 1953, na aldeia de Nitzkydorf, perto de Timisoara, na Roménia. Estudou alemão e literatura romena na sua terra natal e trabalhou depois como tradutora numa fábrica de Timisoara, antes de ser demitida das suas funções em 1979 por se ter recusado a colaborar com a polícia política de Nicolae Ceaucescu.

Müller acabou por abandonar o seu país em 1987 para ir para a Alemanha com o marido, o também escritor Richard Wagner. Para trás deixou uma longa luta perdida pela publicação dos seus trabalhos frontalmente críticos ao regime totalitário de Ceausescu, que acabaria por ser derrubado dois anos depois de Müller sair da Roménia.

Em 1984 foi distinguida com o Prémio Aspekte e onze anos depois recebeu o prémio europeu de literatura Aristeion e foi eleita para a Academia Alemã para Língua e Poesia. Em 1998, recebeu o prémio irlandês IMPAC, no ano seguinte o Prémio Franz Kafka. Em 2003, foi galadoarda com o prémio Joseph Breitbach de literatura alemã, em 2004 com o prémio de literatura da Fundação Konrad Adenauer e, em 2006, com o Prémio Würth de literatura europeia.

A notícia da distinção com o Prémio Nobel da Literatura 2009 apanhou desprevenida a escritora alemã. “Estou surpreendida e ainda nem acredito, de momento não posso dizer mais nada”, disse Herta Müller num comunicado divulgado pela Hanser Verlag, a editora da romancista.

Público

domingo, 4 de outubro de 2009

Anne Frank - as únicas imagens em vídeo


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A notícia é de hoje, no i on-line:

As únicas imagens em vídeo de Anne Frank foram colocadas no Youtube pelo museu holandês com o seu nome para chamar a atenção das novas gerações para a sua história e diário.Ao 9º segundo do vídeo é possível ver Anne Frank, que se inclina no parapeito de uma janela para ver uma noiva que passava na sua rua.O filme data de 22 de Julho de 1941, um ano antes da família de Anne Frank ser obrigada a esconder-se dos Nazis. A família foi descoberta em Maio de 1944 e Anne morreu num campo de concentração Nazi em Março de 1945.
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Livro(s) do mês - Outubro

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À espera da Feira do Livro, no Colégio, em Novembro...
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Ler - Outubro

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O prazer de ler...

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Imagem retirada de: www.olhares.com
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Seguem-se os textos que os alunos de 11ºAno produziram na primeira semana de aulas, a partir do excerto do romance de Sepúlveda, O vellho que lia romances de amor. O objectivo era tentarem evidenciar a surpresa, a emoção, a cumplicidade que a leitura de um livro nos desperta... São vários os testemunhos...
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Uma a uma, quando incrédula terminei a leitura das páginas desta obra, as luzes do livro extinguiram-se na distância e compreendi que já tinha começado a recordar, a esculpir uma recordação na minha memória, sabendo-me afortunada por ter saboreado os seus segredos. Observava aquela Barcelona abandonada, confusa, turbulenta, criminosa, como que obcecada por um amor que não era meu, não correspondido, em que a minha existência era feita de ausências, sem outro nome ou presença que não as de um estranho. Era apenas demasiado tarde para parar, desistir, sabia-o! Barcelona estendia-se nos sonhos de um escritor, num cemitério dos livros esquecidos, através de um labirinto de segredos e fascínios, de cumplicidades e traições. “Cidade dos malditos” foi como lhe ouvi chamar, onde as páginas são mais que memórias, mas simples suspiros, últimos, que se apagam. Foi também num último suspiro que percebi que tudo não passou de um jogo do anjo, de Zafón, tão perfeito, inigualável, “um céu azul cor da sorte e uma brisa limpa com cheiro a mar”.
Tatiana, 11º A
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Sinto-me inquieta. Ao pisar páginas tão delicadas, com palavras tão frágeis, sinto-me realmente inquieta. Como se transportada para um mundo paralelo, ou talvez com a alma mesmo a resvalar para esse mundo. Distante, ao sol, longe da penumbra, desinstalo-me intrinsecamente. Umas palavras ficam, outras desaparecem. As que ficam deixam marcas profundas, porque relembram, ou comparam, ou relativizam... Porque permanecem. E mudam-nos. A minha inquietude justifica-se aqui, com esta inconstância de sentidos que irrompem, ou simplesmente acontecem, que me aprisionam e me tomam como deles. Domam em definito o meu coração, tornando mágica a leitura das suas páginas. Processo divino, onde a luz permanece...
Sara Cardoso, 11ºD

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O papa começou a relatar uma história do seu tempo na guerra. A tentativa de atentado ao comboio falhara e eles tinham sido descobertos. Ao meu lado não havia agora senão uma floresta imersa no mais intenso véu de negrume e uma cabana onde estavam a ser atacados os “assassini”. Não conseguia descolar os olhos das páginas. As palavras corriam, sôfregas, atropelando-se na entrada para a minha mente. Em toda aquela explosão de acontecimentos quase que me perdia, mas a percepção de uma morte trouxe-me de volta. Só agora me tinha apercebido da chuva de “fogo” na qual me encontrava. Sob ataque, iniciei a fuga. Eu era, neste momento, o pequeno di Mona e fugia, meio atrapalhado no meio do escuro, com o meu chefe. Estava a ficar sem fôlego, e parecia que me tinha caído uma bigorna no coração – para trás ficavam os meus amigos, já sem vida. Corria e corria e, então, de repente… Olho à minha volta e vejo a mesa do quintal da minha avó, o limoeiro, a roseira. O meu irmão chamava-me, mesmo junto a mim. Tinha voltado à realidade.
José Nuno Silva, 11ºA

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É fácil ter livros, toda a gente os tem, também é fácil ler livros, toda a gente os lê, o que é difícil é viver o livro. É penetrar nas suas páginas, é fazer de cada palavra, de cada acento, de cada adjectivo o ambiente que nos rodeia. É desconstruir o que conhecemos, nem que seja por uns momentos, para aprender um novo século, para viver o que até aqui apenas tínhamos imaginado. É levar-nos a perder a identidade, é não sabermos ao certo quem é o protagonista e o leitor, é envolvermo-nos de tal forma que os carros passam a carruagens, as estradas ganham terra e poeira, as calças de ganga dão lugar aos vestidos compridos que combinam com os sapatos de salto alto, vermelhos ou pretos, bem brilhantes, que fazem um barulho elegante ao subir a escadaria do teatro, anunciando claramente a chegada de uma Raquel Cohen. É lermos os elogios e recebê-los como nossos, é apoderarmo-nos dos maridos, dos amantes, dos amigos, das profissões, das qualidades e dos defeitos. E tudo nos parece tão familiar, tão assustadoramente normal, que aumenta a ilusão. E mesmo quando a travessia parece difícil, é raro escapar sem uma comparação, sem um único desejo, a mínima inveja, (ou o que lhe quiserem chamar), de um dia ser também uma Maria Monforte, um Carlos da Maia ou um Ega. Um livro tem este efeito sobre nós, só é preciso encontrá-lo.
Teresa Stingl, 11ºA
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Mil e uma imagens me surgiam e mais não fazia do que ler uma e outra e ainda outra página daquele fascinante livro. Miguel Sousa Tavares, num conjunto perfeito de palavras, descreve ao pormenor cada paisagem, cada povo, cada cultura em todas as suas avassaladoras viagens. Tudo para mim era novo: os costumes e tradições, a população proveniente de cada lugar, a própria forma de viver. O entusiasmo de uma recente descoberta parecia resvalar em cada sorriso em mim despertado. Por momentos, confundia-me totalmente com um daqueles habitantes de raça negra, sempre com uma alegria tremenda, uma simplicidade estonteante de quem pesca e caça o seu próprio alimento, se entretém a observar a beleza singular de uma borboleta, ou que esquece o mundo e cerra os olhos à luminosidade, numa artesanal cama de rede. De todas as viagens, havia sempre as que mais me emocionavam, que me davam vontade de permanecer um pouco naquela tão díspar realidade, por vezes até em condições inóspitas, mas onde resplandecia um contentamento único e incomensurável de puramente estar vivo, quer sob um calor infernal característico de zonas desérticas, quer sob a chuva incessante e grossa que nos assombra nas zonas equatoriais.
Joana Nunes, 11A

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No Perfume de Patrick Süskind senti, inexplicavelmente, os cheiros que se libertam dos livros. Senti-me transportada de forma intensa para Paris medieval, onde os cheiros nauseabundos ganharam o poder de se entranhar fortemente nas minhas narinas. Diante de cada palavra, uma nova sensação: flores, peixe, fumo, esgotos, essências, frutos, brisas… De todas elas exalava um perfume único. Mesmo os sentimentos da personagem, que, apesar de incompreendida por todos, era compreendida por mim, como se partilhássemos um segredo, tornaram-se meus. Juntos, atingimos o clímax, com todos os sensores olfactivos em alerta máximo. Mas, também juntos, acabámos por alcançar a exaustão. O fim trágico do meu companheiro, levei-o comigo, com todo o seu poder… até à realidade.
Matilde Horta, 11ºE

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Conheci o medo e o amor nas suas formas originais e encontrei-me presa nos parágrafos que dão vida a esta história. À medida que relia e sondava os olhares profundos e indiscretos, era capaz de sentir o peso das decisões tomadas em defesa da vida, que repetidas vezes oscilava no auge do perigo. Deparei-me com a paixão escondida em almas que não se permitiam amar nem conhecer um sentido único. Ansiei que se juntassem e me escrevessem uma nova história que me voltasse a aprisionar nas páginas do seu amor. Voei e morri com personagens enigmáticas que imaginei reais e que me deixaram saudade quando virei a última página.
Ana Luísa e Ana Rita, 11º D/E
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(Trabalhos enviados por Auxília Ramos)
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sábado, 3 de outubro de 2009

Fernando Pessoa (ante)visto pelos alunos

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Conheço-o em bronze, de perna cruzada em pleno Chiado. Aí, as suas vestes negras, já oxidadas pelos pensamentos que o envolvem, destacam-no do comum mortal. De chapéu Borsalino, óculos redondos e bigode curto, exalta toda uma aura de emblemático lírico camoniano, maltratado pela própria vida que expõe.
Figurando como um true gentleman do virar de século, o autor induz a uma introspecção meticulosa (“Deus quer, o Homem sonha, a obra nasce”). Nesse seu jeito de Charlie Chaplin lúgubre, sei-o também pelos olhos de Almada Negreiros, na pele de porta-estandarte da Geração d’Orpheu, frontispício do Modernismo Português.
Interciso em várias personalidades, cada uma tão complexamente romântica e alienada como as restantes, reconheço o poeta, o génio introvertido, o anglómano autor de ridículas cartas de amor e, acima de tudo, o sombrio mestre da transfiguração.
Mas afinal, quem é Fernando Pessoa?
Personne. Um fingidor, não obstante.
Gonçalo Tiago, 12ºB
(Enviado por Isabel Moreira)
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Sobre o fabuloso mundo de Fernando, tudo ou nada se pode dizer. Como foi possível existir tão prodigiosa imaginação e tão soberba criatividade num ressequido empregado de escritório?
A imagem dum sujeitinho atarracado e nervoso para que o ponteiro atinja a hora de saída do trabalho é a primeira coisa de que me lembro, quando penso em Fernando Pessoa. Talvez fossem essas as horas em que se tornava num tantológico Alberto Caeiro, antes de abrir a correspondência e de se transfigurar num ácido e geometricamente educado Ricardo Reis que, enquanto fumava um velho cachimbo, contava os envelopes.
Todos nós temos um feitio especial para as horas más; no entanto, Pessoa inclina o seu humor difícil para um engenheiro torrencial que respira Ópio e que ferve vaporosas complexidades por cada orifício.
A meu ver, todo o seu fabuloso mundo é ridículo – ou até insólito – e talvez seja isso que faz dele um objecto tão interessante e digno de destaque numa literatura tão preenchida.
Nuno Pereira, 12ºB
(Enviado por Isabel Moreira)
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Ao reflectir um pouco sobre a "figura desfigurada" de Fernando Pessoa, percebemos um começo inacabado, um olhar desvanecido por entre uma atitude observadora, crítica e, acima de tudo, genial.
Talvez pela capacidade de criar mundos dentro do seu próprio mundo me fascine. Uma personalidade desmembrada em Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis que só assim se torna una. É sem dúvida admirável. Desdobra-se nas capacidades, nos sentimentos, no carisma, na atitude, na razão que, de maneira nenhuma, consegue conciliar. De certo modo, existem pessoas dentro de Pessoa que renascem e se alimentam a cada poema…
Pessoa vê-se com Mil Caras, Mil facetas “não s[endo] do tamanho da [sua] altura (…)” mas sim “(…) do tamanho daquilo que v[ia]”.
Raquel Oliveira, 12ºC
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Fernando Pessoa é, no fundo, a criança que nos dias de hoje, passaria horas a receber conselhos e a ouvir alguém à procura da sua verdadeira essência, quando, na verdade, ninguém o perceberia verdadeiramente. Nem ele próprio.
Na sua curta vida, ninguém achou nele o génio criativo que viria a surpreender-nos após a sua partida. E ainda agora não o compreendem.
Esta incompreensão, esta profundidade e esta loucura com que finge, imagina, inventa o seu verdadeiro “eu” é o que fascina e que nunca lhe saciou a sua fome da diferença.
Num mundo dito hoje tão “aberto”, mas onde as diferenças (já nem falando nas desigualdades) estão tão esbatidas e são tão mal encaradas, debrucemo-nos sobre uma escrita que nos alucine e num “demónio” que nos rompa do comum.
Se um poeta é, como o próprio diz, “um fingidor”, Pessoa é, então, o melhor poeta de todos os tempos.
Maria Gaspar, 12DE
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Enigmática personagem, Pessoa tornou-se para mim um mistério, construído através da pressão escolar e televisiva. É aliás sempre retratado como um escritor caracterizado pelo poder que tinha em desfragmentar o seu ser em vários heterónimos, associados a peculiares e arrojados modos de se apresentarem, tão metodicamente preparados por Pessoa - genial disfunção para encarnar várias personagens...
Por fim, diria que este escritor, Fernando Pessoa, dedicou a sua vida à cultura, à reflexão exploração do seu próprio ser, apurando os sentidos humanos e direccionando-os para a sua verdadeira paixão, “ A minha pátria é a língua portuguesa”.
Luís Ramos, 12ºC
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Fernando Pessoa, escritor de renome, pertence ao círculo de figurinos da literatura Portuguesa. Assim, o conhecimento que detenho dele provém das expectativas que os professores me incutiram.
Para mim, Pessoa é a personificação do conceito de Poeta enquanto observador quer do mundo exterior, quer do interior, infinitamente complexo. Fazendo jus ao apelido, desdobra-se em três personalidades, primando pela infatigável reflexão sobre a dor de pensar e a natureza do ser. Marcado pela solidão e pelo vício, compreendo o ter criado mundos exclusivos, convertendo-se num auto-proclamado fingidor.
Alguns estranham a sua figura, escarnecem do reconhecimento póstumo. Contudo, num Portugal desprestigiado, torna-se imperativo evocar os «eus» Pessoanos e, quais peças num puzzle, deslindar o talento que excedeu os limites do imaginável.
Filipa Alves Santos, 12ºB
(Enviado por Isabel Moreira)

Musicografias VI

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Desta vez não saímos de Portugal, mas recuamos no tempo, para a transição entre o século XVI e o século VII. Sugiro uma música de Duarte Lobo composta sobre o texto litúrgico do Requiem, especificamente a parte do Introitus, aqui interpretada pelo grupo inglês "Tallis Schollars", grupo que já tive o prazer de ouvir em concerto duas vezes.
A informação biográfica sobre Duarte Lobo, que assinava "Eduardus Lupus", é escassa. Acredita-se que terá nascido em Alcáçovas, Diocese de Évora, onde anos mais tarde foi Mestre Capela da sua Catedral. Sabe-se que foi também mestre capela em Lisboa. A sua música enquadra-se naquela a que os musicólogos chamam a "Época Dourada" da polifonia portuguesa. Escreve essencialmente em estilo contrapontístico renascentista, um estilo melodioso e profundamente respeitador da importância do texto latino, segundo o "modelo" de G.P. da Palestrina, autor de referência da época.
Já a música fala por si. Para ouvir de olhos fechados.

Joaquim Silva
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