terça-feira, 7 de outubro de 2008

Pessoa(s) - 12ºAno

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Fernando Pessoa (ante)visto pelos alunos
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O Lusografias alargou novamente o seu âmbito a outras turmas e respectivas professoras. É a vez do 12ºano. Em Oficina de Escrita, foi solicitado aos alunos que antecipassem e tentassem sondar a dimensão e a alma de Fernando Pessoa. Eis o resultado:
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Repudiei sempre que me compreendessem. Ser compreendido é prostituir-me. Prefiro ser tomado a sério como o que não sou, dizia.

A complexidade física e poética de Fernando Pessoa sempre acompanhou a imagem que guardo daquele que é o maior poeta português do século XX. Uma sufocante sede de normalidade, que tentou saciar toda a sua vida, em vão. O entendimento (demasiado) profundo da alma e da realidade do Homem racionalizou-lhe o coração e consciencializou-lhe a ingenuidade.

Penso, logo existo, diria Descartes? Ah! Pessoa viveu a pensar e levou uma existência despercebida na sociedade do seu tempo. Foi um rasgo desintegrado de genialidade. Levou uma vida social apagada, excluído biologicamente pela anormalidade pensante do seu coração.

Eu sempre o imaginei sozinho. Num quarto despido e impessoal, no centro de Lisboa. Uma secretária. Uma garrafa e papel, onde se buscava em heterónimos e em palavras. Onde racionalizava sentimentos e procurava, em vão, a felicidade ingénua da inconsciência. E ele fascina-me sempre e, de cada vez que o leio, aumenta em mim a vontade de o conhecer intrinsecamente, por dentro. De sentir exactamente o que Pessoa sentia. De perceber o que foi para ele sentir-se ser desconforme, ao querer renegar o que tantos procuram alcançar durante toda a vida - o entendimento profundo da alma e do Homem.
Mas não. Fernando Pessoa não se prostituiu. Jamais.

Inês Viterbo 12ºD


Num outro momento, os alunos partiram de uma citação de António José Saraiva:

“Fingir a dor que deveras sente: este enunciado resume o problema essencial da literatura. A dor sentida é a realidade, o seu fingimento é a literatura.”, António José Saraiva, in “Ser ou não ser arte”




Lisboa, 15 de Setembro de 1910

Desiludo-me. Por muita razão que tenhas quando me dizes que “a palavra é a arma mais poderosa de todas”, apercebo-me de que há dores que não se dizem. Mesmo tendo eu esse “domínio manipulador das palavras”, de que me falavas.
Tudo isto é um fingimento. A literatura é fingimento. As palavras são insuficientes – morrem na praia do que sinto – e todos estes floreados, a mim, parecem-me fictícios, não atingem plenamente a expressividade que quero dar-lhes. E que “sujeito poético” fingido que eu devo ser, não?
Ora essa! Não compreenderão o que digo, porque não me compreendem e, portanto, não sentem a minha dor. Talvez reinventem a dor inventada de um sujeito poético que não passa de uma invenção deles!
E se eles não sentem a dor que eu senti, meu caro amigo, nem sequer a que passei para o papel, de que se trata tudo isto, então? De um fingimento. Que nunca atingirá a pureza do sentimento original. Por minha culpa – que alimento este desejo de racionalizar-me -, por culpa das palavras – que não se bastam -, e por culpa deles – que querem compreender-me.

Fernando Pessoa (por Inês Viterbo)

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