sábado, 21 de fevereiro de 2009

2009 - O ano de Bartolomeu de Gusmão e da "Passarola"

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O físico Carlos Fiolhais (co-autor do blogue De Rerum Natura) escrevia, no semanário Sol, no último sábado, esta crónica que tomo a liberdade de transcrever. Para os amantes do Memorial do Covento de Saramago, do padre-inventor e da ciência em geral...
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2009 é o ano Galileu (400 anos das primeiras observações telescópicas, anunciadas em “O Mensageiro das Estrelas”) e é também o ano Darwin (200 anos do nascimento de Darwin e 150 anos de “A Origem das Espécies”). Mas é também o ano Gusmão, pois passam três séculos sobre a experiência efectuada em 8 de Agosto de 1709, diante da corte, em Lisboa, pelo padre luso-brasileiro Bartolomeu de Gusmão (1685-1724), um estudante de Cânones em Coimbra, na altura com apenas 24 anos.
Tratou-se, nada mais nada menos, da primeira ascensão de um objecto mais pesado do que o ar, precedendo de dezenas de anos a primeira ascensão humana em balão, protagonizada pelos irmãos Montgolfier. O povo haveria, jocosamente, de designar por "Passarola" a máquina voadora do padre, cuja fama foi modernamente ampliada pelo romance “Memorial do Convento”, de José Saramago.
Gusmão escreveu um “Manifesto” sobre o seu invento. Na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra guarda-se, além deste, uma cópia da petição que o padre, formado na Companhia de Jesus, dirigiu ao rei D. João V para lhe ser concedido o privilégio de só ele poder fabricar instrumentos para voar. A linguagem da petição é deliciosa valendo a pena saborear um bocado:
"Senhor, diz Bartolomeu Lourenço que ele tem descoberto um instrumento para se andar pelo ar, da mesma sorte que pela terra e pelo mar, e com muito mais brevidade, fazendo-se muitas vezes 200 e mais léguas de caminho por dia, no qual instrumento se poderão levar os avisos de mais importância aos exércitos e terras mui remotas quase no mesmo tempo em que se resolverem: o que interessa a Vossa Magestade muito mais que a nenhum dos outros Príncipes pela maior distância do seu domínio, evitando-se desta sorte os desgovernos das conquistas, que procedem em grande parte de chegar muito tarde a notícia deles a Vossa Magestade."
O despacho régio foi favorável ao pedido, que hoje designaríamos de registo de patente. O feito de Gusmão é um bom exemplo do engenho luso. Mas, como em tantos outros casos, este engenho não teve sucesso...
Carlos Fiolhais, Sol

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