terça-feira, 14 de dezembro de 2010

José e Pilar





No dia 30 de Novembro, às 15h, as turmas do 12º ano foram ao cinema Dolce Vita, onde teve lugar uma sessão que contou com a presença do realizador, com quem os alunos tiveram a possibilidade de dialogar e debater algumas questões. “A Viagem do Elefante”, o livro em que Saramago narra as aventuras e desventuras de um paquiderme, transportado desde a corte de D. João III à do austríaco Arquiduque Maximiliano, é o ponto de partida para “José e Pilar”, o filme documentário de Miguel Gonçalves Mendes, que retrata a relação entre o Nobel José Saramago e Pilar del Río. O filme pareceu-nos, pois, um bom pretexto para os alunos conhecerem um pouco mais sobre o autor do romance “Memorial do Convento” (a estudar em aula), bem como o homem que tem uma visão muito particular sobre o mundo e que dela nos dá conta ao longo da sua produção literária.
Deixamos alguns testemunhos desta experiência didáctica:

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Vejo-te velho, cansado, pregueado por rugas, curvado… vejo-te de óculos, sentado, pasmado, incomodado, observador, observado, com vontade de saber-te “quase homem” Saramago. Ouço o som da tua voz rouca, e o som dos significados que ela transporta. Sinto que o tempo é a montanha que nos espera no topo, e não nos dá o caminho de volta. Sinto que nos deixas apenas uma falta de espaço físico, um lugar chamado anti-lugar, como se a vida (que vida?) coubesse mesmo no pico da montanha da criança.
Penso nisto: e é tudo a vontade de saber-te “quase homem”.
Teresa Stingl, 12A


Talvez tudo o que chegue tarde, não chegue tão tarde como o amor. Mas Saramago soube esperar. Esperou até encontrar Pilar, a protagonista de toda a sua vida. A imagem de Saramago transmitida pela televisão, pelos jornais e revistas, não é de todo aquela que figura no filme “José e Pilar”, realizado por Miguel Gonçalves Mendes.
José Saramago vestiu, na minha opinião, excessivas capas durante o seu “percurso humano”: a de comunista desgraçado, a de aparente recusa da própria nacionalidade ou até a de ateu em quem ninguém acreditava. Sempre foi incompreendido por toda a sociedade portuguesa, chegando a sua obra a ser repudiada por todos aqueles que gostavam de acreditar nos media. No entanto, essa não foi a imagem com que fiquei após o visionamento de “José e Pilar”. Nem eu, nem ninguém. Ninguém pode ser capaz de permanecer indiferente a tamanha história de amor ali retratada. Poderão talvez considerá-la uma exploração das vidas de José e Pilar, mas o que aconteceu durante quatro anos de filmagens, não pode nem deve ser tido como explorado ou manipulado.
Penso também ser imprescindível referir todo o trabalho cénico do filme. Desde a banda sonora, que considero soberba e inesperada, até à forma como as cenas estão montadas ou as pessoas filmadas. “José e Pilar” assume o papel de documentário sobre a vida de duas figuras públicas e da sua história de amor. No entanto, a maneira como todo o filme foi filmado surpreendeu-me imenso. Este “documentário” pode assumir o corpo até de um romance, se assim quisermos rotulá-lo.
Sempre tive a impressão de que Saramago levava uma vida fácil, sem nenhuma dedicação ou interesse. Contudo, a fugacidade com que a viveu é capaz de apavorar. Saramago habitou uma vida absoluta, inundada de compromissos, não só “literários” como também pessoais. Era em Pilar que ele se apoiava, não por conveniência, mas por vontade.
Para concluir, devo dizer que “José e Pilar” foi capaz de me despertar a reflexão em relação à vida e à forma como tratamos as pessoas, quer elas sejam próximas ou não. O Saramago insensível não existia. Quem o substituía era o Saramago apaixonado e devoto.
Luísa Santos, 12ºD
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Fomos ao cinema ver o filme "José e Pilar" e, no fim, tivemos a possibilidade de falar com o realizador Miguel Mendes.
Já tinha curiosidade de ver este filme mas, na minha opinião, o documentário excedeu todas as minhas expectativas. É como ver o outro lado de uma pessoa. O que ouvia sobre Saramago nunca era de forma completa e isenta, ou seja, nunca completamente mal, mas também nunca completamente bem. A minha opinião sobre ele não era nenhuma, pelo facto de, em mim, haver tantas discordâncias que me colocavam por fora do assunto. Este filme/documentário fez-me perceber que há uma pessoa por detrás de um escritor, uma pessoa que tem opiniões como todas as outras e que não tem medo de as admitir. Um homem forte que, com nenhuma ou quase nenhuma formação, ganhou um prémio Nobel. Um homem que ama, ama muito, que de pouco tem medo e, em pouco, existe incerteza na sua vida.
Recomendo o filme, são duas horas que, de novo, na minha opinião, não nos cansam, mas sim nos fazem perceber o que perdemos e ganhamos com este homem.
Rita Reis, 12ºE
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José e Pilar, ainda em exibição num cinema perto de si, chega ao mundo como um relato da vida de José Saramago e Pilar del Rio nos últimos anos do Nobel da Literatura. Filme realizado por Miguel Gonçalves Mendes, foi produzido com gravações do dia-a-dia do casal, enquanto Saramago lidava com a sua vida, a de Pilar, e A viagem do elefante.

O Homem

José de Sousa Saramago surge-nos, nesta longa-metragem, despojado do traje egocêntrico que sempre lhe tentaram vestir, sem presunções ou altivez. Apercebemo-nos que, de facto, a pessoa quase ignóbil e inquestionável criada pela imprensa não passava de uma máscara ignorada por Saramago. Este era, como todos nós, um ser humano, normal, e de uma simplicidade inicialmente estranha. Acima de escritor, José Saramago era um Homem, que apenas se distinguia verdadeiramente pela sua forte personalidade, vincada de fundamentados ideais.
Tal como a viagem do elefante, a vida de José Saramago também teve um fim, e, enquanto este o esperava pacientemente, sem pressas, da mesma forma que Ricardo Reis assinalava o inevitável ponto final, queria sempre viver um pouco mais, fruto de um carpe diem em que diariamente se envolvia. Em José e Pilar damos conta do célere quotidiano do escritor português, que viajava em torno do globo, retirando um pouco de si para dar aos outros, àqueles que nem sequer conhecia, durante um tortuoso processo que viria depois a acamá-lo.

A Mulher
Pilar del Rio é a personificação da letra capitular da palavra Mulher, uma mulher de armas que apenas parecia baixar a guarda a um homem quando este era Saramago, e ninguém mais! Dotada de um forte feminismo, a Presidenta (sem aspas) da Fundação José Saramago, foi verdadeiramente o pilar da vida do português. Na vida do Homem e do escritor a jornalista surge como pedra basilar, funcionando como força motriz para toda aquela correria desenfreada.
Aos olhos do espectador, Pilar comprova a adulteração pública de que sofreu o véu que a cobre; a personalidade forte é comprovada, mas a tirania de que a acusam é blasfémica. Por detrás de um grande homem existe sempre uma grande mulher, e era esse mesmo posto que Pilar del Rio ocupava, entregando a Saramago força para continuar quando parecia que simplesmente não dava mais. No fundo, Saramago parecia viver para Pilar e Pilar vivia para Saramago, numa relação de reciprocidade apoteótica.
O resultado de toda esta produção é bastante bom e cumpre, de forma irrepreensível, ainda que porventura indesejadamente, a função de reestruturar e renovar a imagem que o Mundo possui de José Saramago, uma imagem mais intimista e próxima do real. E, com a visibilidade que a morte do escritor recolheu, tem a possibilidade de fazer espalhar esta nova fé, com muito maior sucesso.
Está (re)descoberto o Homem por detrás da personalidade ideológica e literária.
Francisco Gomes, 12ºD
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“José e Pilar” é o mais recente filme de Miguel Gonçalves, um filme tão realista que toca o maior grau de crueldade e consciência. Um filme, no mínimo, arrepiante. José Saramago chega, assim, às salas de cinema, inteiramente a descoberto.
Miguel Gonçalves apresenta-nos uma obra que se escreveu sozinha, uma obra que, no fundo, não necessitaria de realizador, de luzes ou de câmara. Foi-nos ostentado um herói da escrita, cujos poderes o fizeram refugiar-se num país que não era o dele, numa língua que nunca foi sua. Culpando Pilar, destituímos a culpa de termos repelido um dos maiores escritores portugueses para um pedaço de terra que nunca lhe pertencera. Mas terá sido toda essa culpa atribuída em vão? Atribuída ao acaso? Não era Saramago um herói? Então, qual o porquê deste abandono quase repulsivo? Qual o porquê de não lutar contra um país que se faz de cego? Qual o porquê de não lutar contra um país que não lhe convinha, mas que nunca deixou de ser seu? Terá sido toda essa culpa atribuída em vão? Atribuída ao acaso? A Pilar, que nos foi vangloriada como salvadora de Saramago, e que pareceu esconder uma mulher cujas convicções, por vezes, se tornavam mais altas que o próprio marido. A Pilar, que nos foi vangloriada, começou a transformar-se numa mulher cujo juízos de valor em relação a Portugal quase se liam sem precisarem de ser escritos. Apontando-nos como membros de um governo que não presta, generalizando-nos como superiores em relação a tudo, conseguiu, em parte, justificar toda essa culpa que lhe fora atribuída. Porque, no fundo, o que transpareceu foi que nem Portugal nem Saramago se haviam separado, mas que os interesses políticos de Pilar del Río e de um governo que, realmente não presta, colidiam, tornando a convivência entre os dois impossível.
Miguel Gonçalves introduz-nos, então, a história de amor entre José Saramago e Pilar del Rio. E a disputa da mesma em tentar vingar-se de um país que nunca a acolheu.
Ana Catarina Tonel, 12º E
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Queria fazer um documentário sobre Saramago, talvez porque não acreditava no que diziam sobre ele, e reparou que Saramago era, em parte, Pilar. Assim nasceu este documentário de Miguel Gonçalves Mendes, acompanhando a escrita do livro “A viagem do Elefante”.
Saramago era, sem dúvida, uma figura carismática, polémica, neste país, e ainda o é. Tudo o que eu sempre ouvi sobre ele, e, provavelmente, quase tudo o que foi dito sobre os seus ideais, foram comentários negativos ou insignificantes, coisas que me pareciam realmente exageradas para um homem só. Perguntava-me se era possível existir alguém tão maldoso e fora de senso. Neste filme, Saramago aparece-nos como um homem simples, de ideias firmes, mas nada disparatadas, um homem que via o mundo de um modo diferente, mas não errado. Ao seu lado, é-nos apresentada Pilar del Río, jornalista considerada irreverente e fria, mas que, no fundo, apenas se dedicava a quem amava. A relação entre um e outro baseia-se no respeito e no dedicar das suas vidas mútuo. "A Pilar, que ainda não havia nascido, e tanto tardou a chegar", a quem José estava irremediavelmente destinado, com quem se verá noutro sítio. A ideia de alguém estar determinado a outro, não por obrigação, mas por desejo e realização de uma vida feliz, é uma das muitas formas de Saramago demonstrar a paixão inevitável que o fez viver a vida.
É importante referir Portugal, concretamente os portugueses, no meio de tudo isto. Este documentário embaraça qualquer um. De facto, ou o espectador é confrontado com a falta de atenção dada a este escritor, que tanto era cobiçado no resto do mundo, pelo nosso país, ou envergonha-se com a excessiva cretinice dos jornalistas portugueses, não generalizando, com alguns dos jornalistas portugueses.
No fundo, a imagem degradada e incoerente de Saramago é desmanchada, mostrando-nos que, apesar de todas as suas convicções, ali se encontrava apenas um homem, sem sabedorias divinas ou pretensões egocêntricas. Um homem com Pilar, com os livros e consigo próprio. Saramago era…
Ana Luísa de Matos Gomes, 12ºE
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“Eu tenho ideias para romances, ela tem ideias para a vida”
Tenho feito publicidade ao trabalho de Miguel Gonçalves Mendes, com quem tivemos a possibilidade de conversar, após assistirmos a José e Pilar. Confesso que li pouco de Saramago: apenas A Maior Flor do Mundo, quando era mais pequena. Mas também admito que era impossível não conhecer o tão irreverente, caótico, nobel, José Saramago. De Pilar, apenas conhecia o rosto, das imagens que passaram na televisão no dia da morte do marido.
A frase que tenho repetido é curta: afinal havia um ser humano por detrás do escritor. É tão simples quanto isto. Saramago podia ser muito polémico e era-o, mas só por dizer, de forma tão despreocupada, tudo o que pensava. Infelizmente, essa foi a máscara com que viveu, pelo menos no nosso país.
Miguel Mendes mostra-nos um homem diferente, que dedicou a sua vida a “Pilar, que ainda não havia nascido e tanto tardou a chegar”, cujo único medo se lia nas entrelinhas de “Subi ontem à Montanha Blanca. Lembro-me de haver pensado, enquanto subia: Se caio e aqui me mato acabou-se, não farei mais livro.”
Sara Cardoso, 12º D
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Olho-te o mais fundo retalho de alma. Vejo, como Blimunda, a “vontade” que trazes no mais íntimo do teu ser. Pareces-me caído, cansado. Um homem que suga os dias na ânsia de uma morte que não tarda. E, mesmo assim, moves-te. Aproveitas cada segundo que te é dado. Reencontras a paz que te fortalece nos pensamentos mais distantes. Recolhes cada um deles e uma história começa. Escreves e escreves, regrada mas continuamente. Transpões tudo o que és em simples palavras e uma história prossegue. O fim nada te perturba a mente. Sonhas continuar a tua arte numa qualquer outra vida. E uma história nunca acaba.
Joana Nunes, 12º A
(Enviado por Auxília Ramos)

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