segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O que já lemos - Oficina de Leitura 11ºAno

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"Descobri, ao acordar, que tinha maduro no coração o romance de amor que havia ansiado escrever há tantos anos” – são as palavras do consagrado escritor colombiano Gabriel García Márquez, galardoado com o Prémio Nobel da Literatura em 1982, e autor do aclamado romance Cem Anos de Solidão (1967). É indubitável a razão de se ter considerado este livro uma obra-prima da literatura hispânica (comparável a “D.Quixote de la Mancha”) e um marco lapidar do Realismo-fantástico. Analogamente, não será de estranhar que tenha sido traduzido em mais de trinta e cinco línguas e lido por cerca de trinta milhões de pessoas em todo o mundo.
Ao iniciarmos a leitura desta obra, somos imediatamente transportados para uma realidade completamente diferente da nossa: Macondo, uma aldeia colombiana apartada de tudo. Ela é o palco no qual a história de sete gerações da família Buendía se vai desenrolar, ao ritmo da escrita fluente e cadenciada de Márquez. As minhas palavras nunca serão suficientemente expressivas para descrever a riqueza inerente a cada personagem deste romance. Efectivamente, o que no início aparenta ser a narração simples de uma família vulgar transforma-se, logo nas primeiras páginas, em algo oposto. A história dos Buendía não se limita às circunstâncias espaciais e temporais deste livro: é, incontestavelmente, uma representação universal da natureza humana. Os cem anos, nos quais as vivências de sete gerações, numa aldeia isolada, são relatadas poderiam estender-se por muito mais tempo. A esta família aconteceu tudo o que é imaginável: incestos, homicídios, guerras, pragas, crises políticas e religiosas, abandonos e, acima de tudo, a solidão.
A linguagem magistral de Gabriel García Márquez imprime, ao longo das páginas desta obra, um sentimento inconfundível de destino. O fim irremediável para o qual todas as personagens tendem é subtilmente revelado nas narrações das suas glórias e feitos, bem como das suas derrotas e fracassos. O tempo é retratado não de uma forma linear, mas cíclica. Presencia-se, frequentemente, um certo atavismo, uma noção de repetição. Não são apenas os nomes próprios que são transmitidos de geração em geração, mas também, e principalmente, a tendência para o isolamento e introspecção. É importante enfatizar, contudo, que esta mesma circularidade não é, como pode parecer, enfadonha. Muito pelo contrário: a solidão que assola todos os Buendía, como factor hereditário, confere uma beleza inigualável a esta obra-prima, e coloca-a num patamar superior relativamente aos restantes livros. Ninguém, a não ser Márquez, poderia captar tanto a atenção dos leitores ao ponto de, mesmo já pressentindo a conclusão inevitável do enredo, não conseguirem desligar de uma narrativa tão harmoniosamente peculiar.
Talvez o que há de mais fascinante neste romance seja o modo raro como o autor domina o Realismo-fantástico. O que torna as personagens inesquecíveis é o facto de as vivências que elas trocam com o sobrenatural serem parte integrante do seu quotidiano. Isto acontece com tanta frequência que chegamos a um certo ponto no qual o passado se mistura com o presente, os antepassados com os vivos, o real com o surreal. Contudo, o momento mais marcante desta obra-prima é o seu final. Aquando da leitura do livro, ficamos com o pressentimento de que algo catastrófico irá acontecer, mais cedo ou mais tarde. Embora já estejamos precavidos acerca da iminência de uma tragédia, o último período detém o poder de nos surpreender e despertar os nossos sentidos. Nele, o último sobrevivente dos Buendía apercebe-se do destino incontornável da sua família: “(...) as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a Terra”. A família Buendía, aprisionada pelo seu próprio isolamento, iria cair eternamente no esquecimento, “(…) desterrada da memória dos homens (…)”.
Por fim, é importante reter a ideia de que, se no enredo em questão, esta família colombiana se extingue do mundo e da memória humana, o mesmo não acontece na vida real. A obra-prima de Gabriel García Márquez será sempre lembrada como um dos mais arrebatadores e universais romances que jamais alguém escreveu.

Filipa Santos 11B

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