quarta-feira, 10 de março de 2010

Alda do Espírito Santo

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Alda do Espírito Santo, poetisa são-tomense e uma das vozes poéticas mais destacadas da África lusófona, faleceu ontem.
Em jeito de homenagem,deixo a sua biografia, o testemunho de outros escritores e um poema:
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Nascida a 30 de Abril de 1926 na cidade de São Tomé, Alda Graça do Espírito Santo, combatente da luta pela independência nacional, instruiu a nova geração pós-independência e, pelas suas mãos de poetisa, nasceram versos e rimas que sustentam o orgulho da República Democrática fundada em 1975. Uma referência nacional, que rejeita vanglórias e com humildade continua a batalhar pela conquista do progresso do país soberano.
Desde a juventude que Alda Graça do Espírito Santo viv[ia] na mesma residência na Chácara, arredores da capital São Tomé. Segundo ela, só deixa[ria] aquele lugar quando fo[sse] chamada para o eterno descanso no cemitério do alto São João.
Foi professora da geração de são-tomenses que gritou pela independência nacional.
Criou a primeira geração de jornalistas do país, e como poetisa imortalizou o massacre de 1953 no poema TRINDADE, que, desde a independência nacional, é recitado todos os anos e de forma arrepiante por uma voz feminina.
A poder poético de Alda está presente todos os dias, e em todos os momentos de São Tomé e Príncipe. O grito pela independência nacional, a unidade do povo no coro da esperança é reflectido na letra do hino nacional de que ela é autora.
Membro do Governo de transição, como Ministra da Educação, Alda do Espírito Santo foi também ministra da informação e cultura. Fez dois mandatos como Presidente da Assembleia Nacional Popular.
Criou a União dos Escritores e Artistas são-tomenses, onde continua a trabalhar na criação de novos valores para cultura literária.
Abel Veiga
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«A Alda Espírito Santo foi, num determinado momento (anterior às independências dos países de língua portuguesa), das poucas pessoas que já sabia o caminho a seguir, porque, sobretudo através da poesia, ia indicando aos mais novos qual era o caminho, o caminho da luta, da dignidade dos povos, da independência.»
Pepetela
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Ilha nua

Coqueiros e palmares da Terra Natal
Mar azul das ilhas perdidas na conjuntura dos séculos
Vegetação densa no horizonte imenso dos nossos sonhos.
Verdura, oceano, calor tropical
Gritando a sede imensa do salgado mar
No deserto paradoxal das praias humanas
Sedentas de espaço e devida
Nos cantos amargos do ossobô
Anunciando o cair das chuvas
Varrendo de rijo a terra calcinada
Saturada do calor ardente
Mas faminta da irradiação humana
Ilhas paradoxais do Sul do Sará
Os desertos humanos clamam
Na floresta virgem
Dos teus destinos sem planuras...
Alda Espírito Santo

1 comentário:

auxília disse...

Porque gostei muito deste poema com que José Luís Mendonça, escritor e jornalista angolano, prestou homenagem a Alda Espírito Santo, aqui fica a partilha:


Os poetas não vão para o céu
eles já estão no céu
mortos para o plágio desta vida
como se ninguém mais soubesse


chamar as coisas pelos nomes
que sem querer os transformam
no prumo das portas ouvindo
cantigas de roda ao luar.


Os poetas não vão para o céu
eles já estão no céu
com seus olhos cegos abrindo
o novelo das palavras por dizer.


Por isso os poetas não morrem
se transformam simplesmente
no esplendor desse dia
que cresce entre as linhas da mão.


Montados no pégaso do universo
aparecem às vezes no umbral da via láctea
e a sua mão toca a dimensão do nada
para amealhar os cristais do movimento.


José Luis Mendonça, in 'Um Voo de Borboleta no Mecanismo Inerte do Tempo'